Nesta semana, Donald Trump tomou posse como presidente dos Estados Unidos da América. O empresário retorna à Casa Branca em um mandato previsto para durar até o início de 2029. Neste cenário, cabe refletir sobre o posicionamento de Donald Trump sobre maconha e o que pode mudar em relação à Cannabis medicinal e política de drogas em âmbito local e global.
Representante da ala mais reacionária do Partido Republicano, Trump já tomou uma série de medidas que reduzem direitos , como o o fim do direito constitucional de cidadania automática aos nascidos nos EUA, a saída do país da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do acordo climático de Paris. Há também a promessa de retrocessos em outros direitos sociais e civis, além do ataque à soberania de outras nações. Buscamos então responder as principais questões que surgem no momento em relação à maconha. Confira:
O que Donald Trump diz sobre maconha?
O posicionamento de Trump sobre a Cannabis é repleto de controvérsias. Em seu primeiro mandato, uma das principais medidas do político foi dar fim ao chamado Memorando Cole. O documento era uma recomendação da era Obama para que o Departamento de Justiça não aplicaria a proibição federal da maconha em estados que promulgassem leis legalizando a planta. Isto porque dentro do ordenamento jurídico do país, cabe a cada estado definir seu código penal.
Do mesmo modo, no primeiro governo de Trump houve a ameaça até em relação ao uso medicinal. Embora em sua primeira campanha o empresário tenha defendido o tema, representantes do governo demonstraram posicionamentos favoráveis a restrições. Jeff Sessions, então procurador-geral, chegou a solicitar fundos ao Congresso para processar estados por suas leis favoráveis a maconha medicinal.
O cenário chegou a representar uma ameaça ao setor estabelecido de produção de cânhamo e indústria da Cannabis. No entanto, o republicano foi o responsável por assinar a Lei de Melhoria Agrícola, em 2018. Um dos pontos desta legislação foi a remoção do cânhamo da lista de espécies proibidas. Além do uso do industrial para a produção de diversos produtos, como papel e tecido, o cânhamo também possui aplicações medicinais. Isto porque algumas variações possuem boas concentrações de canabidiol (CBD), o canabinoide mais utilizado para fins terapêuticos. O cânhamo apresenta pequenas concentrações de tetrahidrocanabinol (THC).
O que esperar para o novo mandato de Trump?
Donald Trump retorna ao governo em um momento crucial para o debate sobre maconha nos EUA e no mundo. No ano passado, o então presidente Joe Biden declarou ter planos de retirar a Cannabis da lista de substâncias perigosas (Lista I) e incluí-la na lista de substâncias com potencial terapêutico (Lista III) da Lei de Substâncias Controladas (CSA, na sigla em inglês).
A mudança de classificação permitiria a ampliação do uso medicinal no país, além de abrir novas possibilidades de negócios. No entanto, a ação segue parada e dependerá do novo mandatário. É difícil prever qualquer tipo de decisão. Do mesmo modo, analisar os indicados de Trump para os cargos mais importantes sobre o tema mantém a incerteza.
Harmeet Dhillon, escolhida para assumir o cargo de procuradora-geral assistente para direitos civis no Departamento de Justiça é abertamente crítica à maconha. A advogada já expressou diversas opiniões contrárias baseadas em preconceitos, como dizer que a maconha é a “porta de entrada” para outras drogas. Outra importante indicação foi a de Marty Makary para chefiar o FDA, departamento que regula questões de alimentos e drogas. O médico é um negacionista em relação à maconha medicinal.
Em contrapartida, o presidente escolheu Robert F. Kennedy Jr. para o Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS, em inglês). O político defende o fim da proibição da maconha e a legalização da Cannabis e de psicodélicos para fins terapêuticos. O órgão chefiado por Robert é responsável por supervisionar o FDA.
Trump fará uma nova guerra às drogas?
Durante o primeiro dia de governo, Trump assinou uma ordem executiva autorizando agências a atuarem dentro e fora do território estadunidense para desmantelar organizações criminosas. O texto fala em organizações civis, no entanto, especialistas alertam para o risco de invasões militares. Isto porque outro documento assinado por Trump após a posse abre a possibilidade de uso militar na defesa da integridade. Este documento cita a entrada de opioides como uma ameaça à soberania e estabelece que as forças armadas tenham como prioridade a defesa nacional.
O termo guerra às drogas surgiu na década de 1970 quando Richard Nixon iniciou o processo global de criminalização de diversas substâncias e caça a seus usuários. Recentemente o NY Times revelou gravações que demostraram que Nixon considerava que a maconha não era “particularmente perigosa”.
O que muda no Brasil com Trump?
Atualmente vivemos questões distintas sobre a Cannabis no Brasil. No último ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que portar maconha não é crime. Igualmente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou o cultivo de cânhamo, matéria que aguarda regulamentação dos órgãos competentes. Por outro lado, tramita no Congresso a PEC das Drogas, que visa criminalizar o porte de drogas em qualquer quantidade. Neste sentido, as mudanças no panorama político global podem fazer o pêndulo ir mais para um lado ou outro.
Outro ponto é entender que as medidas protecionistas de Donald Trump podem impactar diretamente a maconha medicinal e questões econômicas. Isto porque, ao aumentar barreiras alfandegárias, taxas de juros e valorizar o dólar no mercado global, o governo poderá impactar diretamente a vida de milhares de pacientes. Uma significativa parte dos pacientes de Cannabis medicinal faz uso de medicamentos importados, que poderão ficar mais caros nos próximos anos.
As incertezas geradas pela posse de Trump só reforçam a importância das associações de pacientes de maconha no Brasil. Plantar maconha, produzir óleos a preço justo com qualidade comprovada é o melhor caminho para garantir o direito dos pacientes. Cabe aos órgãos públicos garantirem a soberania brasileira e os interesses nacionais. Para isso, precisamos superar os absurdos do proibicionismo, regulamentando o plantio, a produção, além do uso adulto da maconha.