O uso da cannabis para fins medicinais é uma alternativa segura e eficaz para o tratamento de diversas condições clínicas. Diversos estudos científicos e análises clínicas cada vez mais confirmam a efetividade do uso medicinal da maconha. Nesse sentido, as associações canábicas são fundamentais para viabilizar importantes trabalhos que exploram as opções terapêuticas da planta. É o caso da parceria entre a APEPI e o Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria (CSEGSF/Fiocruz), que em 2024 avaliou o uso do óleo de cannabis para o tratamento de insônia refratária e ansiedade em pacientes que já faziam uso de benzodiazepínicos sem efetividade.
O Centro de Saúde é uma unidade vinculada à Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Situado em Manguinhos, zona norte do Rio de Janeiro, ele é uma unidade básica de saúde que tem como prioridade o atendimento de moradores da região. A unidade conta com equipes multidisciplinares, com foco na saúde da família. Um destes grupos é o Projeto Semente, conduzido pelos médicos Luiz Montes do Amaral, Raphael Steenhagen e Ernesto Faria. O Projeto Semente foi o responsável por conduzir o relato clínico que investigou os impactos do uso da cannabis em pacientes com ansiedade e distúrbios do sono.
Relato clínico do Projeto Semente
O projeto selecionou participantes que enfrentavam questões recorrentes de saúde mental, assim como passavam por dificuldade para dormir. Os participantes selecionados já faziam tratamentos com benzodiazepínicos, porém com baixa eficácia e alto risco de efeitos colaterais. Nesse sentido, o Projeto Semente buscou tratar as múltiplas condições por uma abordagem holística e não apenas medicamentosa.
A equipe reuniu 20 pacientes para iniciar as abordagens terapêuticas. O grupo de pacientes realizou encontros coletivos quinzenais, de março a julho de 2024, para a prática de escuta terapêutica. Além disso, o grupo atuou com as chamadas Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), como aromaterapia e meditação. A prática clínica também incluiu questões como higiene do sono. Ao longo dos encontros, o tratamento com cannabis surgiu como uma alternativa de nova abordagem.
“Nos encontros quinzenais, desde o início a gente falava sobre o óleo e a questão do estígma e do preconceito, a diferença entre remédio e o que é droga, para desmistificar um pouco”, relata o Dr. Luiz Montes do Amaral.
Óleo de cannabis para insônia refratária e ansiedade
Para o tratamento dos pacientes, o óleo escolhido foi o Schanti, produzido pela APEPI na Fazenda Sofia Langenbach. O Schanti é um óleo rico em dois canabinoides, o canabidiol (CDB) e tetrahidrocanabinol (THC). Atualmente, a APEPI produz e dispensa para os seus associados o Schanti 1000, uma versão mais concentrada e que rende mais. A combinação entre o CBD e o THC foi uma escolha da própria equipe médica em função das propriedades desses canabinoides.
“A gente escolheu o Schanti, entendendo que o THC tem bons resultados para a indução do sono e para o aumento do período. E o CBD tem melhores resultados para a questão da ansiedade. Então a gente entendeu que o Schanti seria o melhor”, destacou Dr. Luiz.
A prescrição do Schanti fornecido pela APEPI contou com a supervisão da equipe médica para a posologia adequada, além de ajustes pontuais da medicação para cada caso individualmente.
“Quando começamos a prescrever, fazíamos o ajuste da medicação a cada encontro. Então a gente tinha um encontro e depois, individualmente, cada um vinha e fazíamos o ajuste da medicação”, relata o médico.
Para avaliar a efetividade do tratamento, cada participante respondeu questionários validados cientificamente sobre qualidade de vida (formulário WHOQOL simplificado) e qualidade de sono (Metodologia Pittsburgh). Ao final do período, os dados foram extremamente satisfatórios.
De acordo com as respostas dos pacientes, 87,5% dos participantes relataram redução no tempo para adormecer. Do mesmo modo, 100% apontaram aumento no tempo total de sono. A melhora no sono tem impacto direto na melhora da qualidade de vida. Por isso, 62,5% dos participantes apresentaram melhora nos índices avaliados para qualidade de vida.
Resultados oferecem novas perspectivas para o futuro
A experiência do Projeto Semente reforça o potencial da cannabis como recurso complementar em saúde pública. Com o avanço das discussões sobre a regulamentação no Brasil, surge a possibilidade de incorporação da cannabis ao SUS, ampliando o acesso a terapias seguras e com evidências crescentes de eficácia.
Instituições como o Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria e a Fiocruz já atuam como pioneiras nessa frente, indicando que estamos diante de uma mudança de paradigma. E para a cannabis se consolidar como uma alternativa terapêutica democrática, a parceria com as associações canábicas como é APEPI é fundamental para o progresso da ciência.